Alexandre Borges

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As eternas lições do profeta

As eternas lições do profeta

Solzhenitsyn e a coragem de confrontar as ilusões e fraquezas da sociedade ocidental num dos discursos mais memoráveis de todos os tempos

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nov 10, 2024
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Aleksandr Solzhenitsyn em Harvard (1978)

“A coragem é o que falta quando vemos o certo e escolhemos o conveniente”

O russo Aleksandr Solzhenitsyn subiu ao palco em Harvard no chuvoso 8 de junho de 1978, em meio a guarda-chuvas, becas e sobretudos da elite universitária americana, com uma jaqueta surrada, de estilo militar verde-oliva, e uma barba espessa e desgrenhada.

Sua figura magra, imponente e austera, dava impressão que tinha mais que seus 1,80m de altura e 59 anos de idade. Como disse Wanda Urbanska, que testemunhou o discurso como formanda, ele parecia “de outro mundo”.

Filha de um professor polonês e autora de um artigo de defesa do discurso, disse que Solzhenitsyn trazia uma visão do Ocidente que surpreendeu, chocou e criou um desconforto palpável, desafiando o conformismo e a superioridade cultural e moral dos Estados Unidos no auge da Guerra Fria.

No palco, Solzhenitsyn, aclamado pelo já clássico “Arquipélago Gulag”, sobre o terror dos campos soviéticos dos quais ele tinha sido prisioneiro por quase dez anos, não elogiava a liberdade americana nem expressava gratidão pelo refúgio que o país ofereceu: “desde os tempos antigos, o declínio na coragem foi considerado o início do fim.” Segundo ele, estávamos afundados em materialismo e acomodação, o que nunca termina bem.

Aquela figura, que parecia saída de um livro de Dostoiévski, não era o orador convencional de uma cerimônia de formatura, com palavras de coach motivacional e hacks de sucesso; ele era um sobrevivente, um homem que havia enfrentado o peso de um império brutal e genocida em campos de concentração.

Ele falava como um profeta bíblico, com a dureza de quem já não teme o peso da verdade. Solzhenitsyn tinha um Nobel de Literatura e era mundialmente respeitado, mas naquele dia parecia deslocado, inquieto, como um exilado no meio de ricos privilegiados e alienados.

A frase de Solzhenitsyn que mais me marcou e que sempre cito é: "a linha que separa o bem do mal atravessa o coração de cada ser humano." Somos infinitamente capazes de escolher, a cada momento, entre o certo e o errado, o justo e o injusto, a vida e a morte, o céu e o inferno.

Como historiador, pensador e dramaturgo, ele também deu ao mundo insights como "a violência só pode ser disfarçada pela mentira, e a mentira só pode ser mantida pela violência". Ler Solzhenitsyn nunca será ultrapassado ou datado. Suas lições e reflexões são eternas.

O russo não estava ali na mais conhecida e respeitada universidade do mundo para aplausos fáceis. Parte da audiência esperava uma condenação feroz do comunismo e uma celebração da liberdade e dos ideais ocidentais. Em vez de endossar o sonho americano, ele iniciou seu discurso, intitulado “Um Mundo Dividido”, com uma clareza brutal, e a cada frase se tornava mais sombrio.

A primeira-dama americana da época, Rosalynn Carter, reagiu ao discurso no National Press Club: “O povo deste país não é fraco, covarde ou espiritualmente exausto.” Muitos comentaristas reclamaram, dizendo que ele era ingrato pelo refúgio que os Estados Unidos haviam oferecido.

Ele sabia dos riscos de falar o que pensava e era um testemunho vivo do preço que se paga pelo compromisso inegociável com as próprias convicções.

"A liberdade ilimitada leva inevitavelmente à corrupção moral."

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